quinta-feira, 24 de abril de 2008

Teatro do desagradável

Quando a peça Senhora dos Afogados estreou no Rio de Janeiro em 1954, sob direção de Bibi Ferreira, ao final da apresentação a platéia efusivamente e em coro atacou Nelson Rodrigues chamando-o de “tarado”. O dedo na cara de Nelson torna ainda mais necessária a sua provocação: “Mas o teatro não é um lugar de recreio irresponsável. Não. É antes, um pátio de expiação. Talvez fosse mais lógico que víssemos as peças, não sentados, mas atônitos e de joelhos. Pois o que ocorre no palco é o julgamento do nosso mundo, o nosso próprio julgamento, o julgamento do que pecamos e poderíamos ter pecado. Diante da verdadeira tragédia, o espectador crispa-se na cadeira, como um pobre, um miserando condenado.”


O teatro do desagradável como o próprio Nelson se intitulava fundador.
Teatro é isso, tem que provocar, tem que incomodar.
Qual é a graça do teatro passivo? Aquele o qual a platéia senta, se acomoda e passa ali o tempo todo do espetáculo como um mero espectador que dá risada e chora, pra no final achar tudo muito legal, bonito e vamos embora pra casa!
Teatro bom é aquele que mexe com o espectador, que instiga, que o deixa desconfortável na poltrona, que o faz querer debater sobre quando chegar em casa.
Teatro bom é aquele que faz a gente pensar, refletir, se injuriar, é aquele que deixa a gente passando mal, suando frio, aquele que acelera nossos sentidos e nos deixa sem graça, nu.
Essa é a beleza do verdadeiro teatro, aquele que é feito com amor, com raça, com vontade. Aquele que é feito por aquele ator que está ali por prazer, por querer dizer algo, feita por um ator real, que fede e cheira como você. E não feito por atores de plástico, atores limpinhos que brilham, que estufam o peito e se mostram cagando pra platéia porque o seu $$ já tá garantido.

É vergonhoso em um país como o Brasil, com tanta gente talentosa, sejam atores, músicos, dançarinos, artistas plásticos, não conseguirem se sustentar fazendo o que gostam, com a própria arte.
É triste saber que a verba destinada à cultura desse país não tem uma justa aplicação e investimento.
É revoltante saber que o dinheiro é usado para trazer os “grandes, belos e maravilhosos” enlatados como A Bela e a Fera, O Fantasma da Ópera, Cats, Les Misérables e muitos outros que todos nós já conhecemos. Ou se não são os enlatados, são as peças com artistas globais, aaaaah essas sim são boas né gente? Modelos, corpos lindos e sarados, enchendo o ** de grana e ocupando o espaço dos atores de verdade.

Conhece a lei Rouanet? Não? Então leia:
http://www.sinprorp.org.br/Codigo_de_etica/007.htm

E aí o que me diz agora?
Consegue pelo menos compartilhar com um pouquinho da minha indignação?

Por que eu faço teatro?
Por amor, paixão, prazer, por poder experimentar um turbilhão de emoções, por poder extravasar, liberar, por vontade de querer crescer, conhecer, aprender, compartilhar, entender o ser humano tendo a maravilhosa oportunidade de poder viver outras vidas, porque eu quero me expressar e como cidadã quero fazer a minha parte perante a sociedade, fazer algo com que eu possa contribuir, contribuir com a minha arte.

Muitas pessoas já me perguntaram quanto eu ganho $$ pra fazer as peças.
Eu sempre dou risada e respondo: O que eu ganho? Eu ganho coisas que o dinheiro não compra, ganho coisas mais valiosas que qualquer jóia, ganho coisas que eu vou levar na minha bagagem pra toda vida, ganho o sorriso e os aplausos da platéia. Quer coisa melhor que isso?

Tem gente que não entende, acha loucura, mas tudo bem eu compreendo, só sabe da magia do teatro aqueles que um dia já experimentaram.
E aqueles que já foram picados pelo bichinho, hummm esses já não tem mais volta! Hehe =]

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